Montadoras querem depender menos do exterior

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O setor de revendas e montadoras automotivas tem passado por altos e baixos desde a pandemia. Uma das principais crises nos últimos anos foi a falta de chips semicondutores no mercado. Desde 2021, as fábricas de automóveis estão com a sua produção limitada devido à crise dos semicondutores. A falta de chips obrigou marcas a atrasar a entrega de carros novos ou optar por entregá-los faltando equipamentos. Além disso, o setor sofre também com os impactos na produção em consequência das restrições a Covid-19 e agora, dos conflitos na Ucrânia. De acordo com a Anfavea, só no primeiro semestre de 2022, aconteceram mais de 20 paradas nas montadoras por conta da falta de peças. A falta de oferta teve reflexo direto e imediato no recuo dos licenciamentos: em junho de 2022, o órgão registrou uma queda de 4,8% em relação a maio e de 2,4% sobre junho de 2021.

Pensando nisso, diversas indústrias brasileiras – não só a automotiva – têm colocado esforços em projetos que tornem as empresas menos dependentes dos países que exportam peças e equipamentos. Uma das principais frentes é a compra de máquinas importadas para ampliar a produção local. Segundo uma reportagem do Estado de São Paulo, a Stellantis, dona das marcas Fiat, Jeep, Citroën e Peugeot, desenvolve atualmente um projeto de componentes para o novo Citroën C3, que começou a ser produzido em sua fábrica em Porto Real (RJ). De acordo com a empresa, já foram nacionalizados com fornecedores em Minas Gerais e São Paulo os itens alavanca de abertura do capô, mola a gás, kit de ferramentas, pedal de freio e berço motor, antes importados da Índia. O projeto continua, e novas peças passarão a ser produzidas no Brasil, como componentes de suspensão. 

Esse assunto, de ampliar a produção local e facilitar o funcionamento da indústria brasileira, foi um dos temas debatidos no evento  Summit “O Futuro da Indústria Automotiva”, realizado em 2022 no Brasil. Na época, o presidente do Sindipeças (que representa a indústria de autopeças), Cláudio Sahad, afirmou ao Estado de S. Paulo: “Estamos estudando medidas de facilitação por parte do governo, com isenção fiscal, para que empresas venham produzir semicondutores no País”, disse. Atualmente, grande parte dos chips para carros é produzida na Ásia. Para Sahad, esse é um gargalo do Brasil e há um esforço entre o setor público e o privado para resolver a dependência. Ele disse ainda ser preciso melhorar o ambiente de negócios no País para atrair essas empresas. 

Antonio Filosa, presidente da Stellantis (reúne Fiat, Jeep, Peugeot e Citroën), disse que as empresas locais são competitivas “da porta para dentro”, com uso de tecnologias, investimentos e mão de obra iguais às de outros países. “Mas essa competitividade acaba da porta para fora.” Entre os desafios, ele citou o sistema tributário e a falta de infraestrutura e de isonomia entre as regiões. Já o presidente da Anfavea (associação das montadoras), Luiz Carlos Moraes, disse que a pandemia provocou uma reavaliação da globalização para determinados itens, como chips, não só para reduzir a dependência da importação, mas também para ser base de exportação. 

O que abalou as cadeias

Segundo o Estadão, esses seriam os principais problemas que afetaram as cadeias produtivas durante a pandemia. 

– Inflação global: com a pandemia, os governos de vários países tiveram de socorrer a população com auxílios. Essa injeção extra de recursos fomentou a alta de preços;

 – Corte no fornecimento: Os lockdowns na China, a fábrica do mundo e também o epicentro da pandemia, provocaram a falta de componentes importados;

– Explosão do frete: O custo do frete marítimo disparou.

Outros setores já ampliaram a produção local

A atitude de nacionalizar itens hoje não fabricados no Brasil para evitar a dependência das importações tem sido estudada também e não só no setor automotivo. Ainda segundo a reportagem publicada pelo Estadão, no setor de eletroportáteis, a Mondial, por exemplo, acelerou a nacionalização em 2020. Passou a fabricar no Brasil ferro elétrico, airfryer, multiprocessador e caixa acústica, antes importados da China. Com isso, criou mais de mil empregos na fábrica em Conceição do Jacuípe (BA). “Era algo que estava previsto para fazermos em quatro anos e fizemos em um”, afirma Giovanni Marins Cardoso, sócio-fundador da empresa, líder do segmento no País em entrevesta ao Estadão. Com a pandemia, diz ele, aumentaram o custo e a dificuldade de trazer esses eletroportáteis da China, e a opção foi produzir no Brasil. Com a fabricação local, a empresa ganhou agilidade para atender à demanda. “Se a venda no varejo vai bem, a fábrica daqui começa a produzir mais itens no dia seguinte, mas, se dependermos da importação da China, uma nova remessa demora entre 90 e 120 dias para chegar.” Para viabilizar a produção doméstica dos quatro eletroportáteis, foram investidos em um ano e meio R$ 80 milhões em máquinas e equipamentos. “Dobramos o nosso parque de injetoras e desenvolvemos fornecedores locais de resistência elétrica, termostato e embalagens”, conta. A companhia planeja uma nova rodada de nacionalização para fabricar localmente secador de cabelo, escova secadora, aspirador de pó e cafeteira. 

Outro setor que também busca menos dependência de exportação foi a de fertilizantes. Inclusive, em março, o governo federal lançou um plano para não depender mais da importação de fertilizantes. O Plano Nacional de Fertilizantes (PNF) possui diretrizes para aumentar investimentos na produção e reduzir a dependência de importação do produto usado na agricultura. Segundo dados da Associação Nacional para Difusão de Adubos, mais de 85% dos fertilizantes utilizados no país são importados, evidenciando um elevado nível de dependência de importações em um mercado dominado por poucos fornecedores. O plano visa reduzir a dependência do Brasil em relação aos fertilizantes importados e mitigar as vulnerabilidades decorrentes da importação dos insumos. Pretende-se diminuir a dependência de importações, em 2050, de 85% para 45%, mesmo que dobre a demanda por fertilizantes.

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